quinta-feira, 4 de junho de 2009

Reverter o abandono

Por: Rita de Cássia de Araújo Almeida
rcaalmeida@ig.com.br

Semanas atrás, um jornal de Juiz de Fora circulou a notícia de que o tráfico e a marginalidade tomaram conta de uma praça central da cidade. Moradores do entorno afirmaram ter deixado de frequentar a praça por causa dos riscos e que já pensaram em mudar-se do local. Veio-me então a pergunta: será que os moradores abandonaram a praça porque a criminalidade tomou conta da mesma ou a criminalidade tomou conta da praça porque a comunidade a abandonou? A resposta mais óbvia é: os moradores abandonaram a praça porque a criminalidade tomou conta dela.
No entanto, fui tentada a considerar também a resposta contrária, ou seja, é na medida em que a comunidade abandona a praça que ela se torna vulnerável à ação da criminalidade. Seguindo esse raciocínio, fiquei pensando em várias outras situações que vivemos e nas quais o abandono faz sua marca.
Abandonamos nossas crianças e assim deixamos que aproveitadores e perversos as conduzam; abandonamos nossos jovens e permitimos que as drogas e o crime os seduzam; abandonamos o rio que corta nossa cidade e assistimos à sua rápida degradação.
Nada pode causar tanto mal quanto o abandono. Abandono é descaso, indiferença; é o nada desejar. O oposto do amor não é o ódio, como se imagina, é a indiferença, atualizada no abandono. É por isso que o casal Jolie e Pitt acerta quando decide se mudar para Nova Orleans, logo após a passagem do furacão Katrina. Acertam também os projetos sociais e ecológicos, que se valem da ocupação dos espaços abandonados pelo poder público, para reduzir as mazelas sociais e os impactos ambientais. Acerta o governo federal quando destina financiamento do PAC para ocupar as favelas do Rio de Janeiro com obras.
Por outro lado, erramos quando abandonamos a escola pública, buscando ensino de qualidade na rede privada. Erramos quando abandonamos o SUS por duvidar de sua eficiência. Será por mero acaso que nossa universidade pública é de inegável qualidade? Será por acaso que o SUS oferece atendimento de excelência em transplantes?
Voltando ao nosso tema inicial - a praça -, sugiro que a comunidade citada duvide que a solução seja abandoná-la ainda mais. Sugiro, ao contrário, que os moradores ocupem a praça. Quem sabe eles desçam dos seus prédios com suas crianças para brincar, como faziam há tempos atrás? Sugiro que façam festas comunitárias, promovam plantios nos jardins e promovam um abraço simbólico à praça. Amar e investir novamente nessa praça é a única maneira de recuperá-la.
Ampliando nossa discussão, defendo que nós ocupemos os espaços vazios e abandonados da nossa sociedade; só assim impediremos sua degradação. Cada vez que recuamos - por medo, insatisfação ou intolerância -, abrimos espaço para que tudo fique ainda pior. Mas o problema é que abandonar é muito fácil... Abandonar não nos exige esforço algum. Para abandonar é suficiente que cruzemos nossos braços; basta que não façamos nada.

2 comentários:

  1. Parabéns pelo blog!
    Você é uma grande escritora, que bom que tem investido cada vez mais nisso...
    Coloquei um link de seu blog nos favoritos do meu.
    nostalgiametafisica.blogspot.com
    Beijos, Taísa

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